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Ilton Caldeira

Emprego nos EUA pode redesenhar rumo dos juros

Em agosto, os EUA registraram a criação de 22 mil novas vagas de trabalho fora do setor agrícola; o nível de emprego mais baixo desde a pandemia eleva as apostas em corte dos juros

Federal Reserve

Próximo encontro do colegiado da autoridade monetária dos EUA está marcado para os dias 16 e 17 de setembro | Foto: Getty Images

O mercado de trabalho é um dos termômetros mais importantes que o Federal Reserve (FED), o banco central americano, observa antes de decidir os rumos da política monetária nos Estados Unidos. Quando se fala em taxa de desemprego e geração de postos de trabalho, não se trata apenas de números isolados, mas de sinais sobre a saúde da economia e da confiança das famílias e empresas. Caso o número de pessoas sem emprego inicie um aumento e o surgimento de novas posições de trabalho diminua, é possível que a economia esteja perdendo velocidade de forma mais intensa do que se imaginava. 

Diante dessa situação, o banco central americano costuma ser mais prudente com as taxas de juros, já que seu objetivo é harmonizar o avanço econômico e o domínio da inflação, sem prejudicar o mercado de trabalho. Ao aumentar os juros, a autoridade financeira encarece o crédito, o que diminui os investimentos e o consumo, atenuando a pressão inflacionária.

Ao elevar os juros, o FED torna o crédito mais caro, o que freia investimentos e consumo, reduzindo a pressão sobre os preços. Mas esse movimento também esfria a demanda por trabalhadores, já que empresas adiam contratações e projetos. Se o banco central percebe que a economia está começando a sentir esse peso de forma mais intensa, com menos vagas sendo abertas e mais pessoas em busca de emprego, ele pode optar por interromper ou desacelerar o ciclo de alta dos juros. Isso porque manter uma política monetária muito apertada em um contexto de fragilidade do mercado de trabalho aumenta o risco de aprofundar a desaceleração e provocar uma recessão.

Por outro lado, se a inflação ainda se mantém em níveis elevados, mesmo diante de sinais de enfraquecimento do emprego, o dilema do FED fica maior. A instituição precisa decidir se prioriza o combate aos preços, correndo o risco de deteriorar ainda mais o mercado de trabalho, ou se flexibiliza sua postura para evitar que o desemprego avance. Essa é a essência do chamado duplo mandato do banco central norte-americano, que é garantir ao mesmo tempo estabilidade de preços e pleno emprego. Não é raro que um desses objetivos entre em choque com o outro, e a habilidade do FED está em ajustar a intensidade das medidas para não perder a confiança dos agentes econômicos.

Nos últimos anos, esse equilíbrio tem sido especialmente delicado. A economia norte-americana passou por choques fortes, primeiro com a pandemia, depois com a inflação impulsionada por gargalos de oferta e pelo aumento dos preços de energia. Quando os juros foram elevados de forma agressiva para conter a alta dos preços, o mercado de trabalho resistiu mais do que o esperado, com baixa taxa de desemprego e geração sólida de vagas. Mas conforme os sinais de fraqueza começam a aparecer, cada relatório mensal de emprego ganha ainda mais peso nas decisões do FED.

Em agosto, os EUA registraram a criação de 22 mil novas vagas de trabalho fora do setor agrícola. No mês anterior foram 79 mil (dado revisado). Foi o quarto mês consecutivo com resultado abaixo de 100 mil empregos – pior resultado desde a pandemia de Covid-19.

Se a tendência for de desaquecimento consistente, o banco central pode ser pressionado a cortar juros mais cedo do que o previsto, estimulando o crédito e tentando dar fôlego às contratações. Mas se o desemprego sobe apenas de forma pontual, enquanto a inflação segue resistente, o caminho pode ser manter juros altos por mais tempo. Em todos os cenários, os dados de emprego são lidos como um retrato da confiança da economia e do bem-estar das famílias, funcionando como um guia central para as escolhas de política monetária. O que está em jogo, afinal, não são apenas números frios, mas a vida de milhões de pessoas que dependem do trabalho para manter o consumo e a roda da economia girando.

Esse equilíbrio delicado explica porque a taxa de desemprego e a geração de postos de trabalho são acompanhadas com tanta atenção. Elas não só influenciam diretamente o ritmo das decisões do FED como também moldam a forma como investidores, empresas e cidadãos projetam o futuro da economia americana. 

O próximo encontro do colegiado da autoridade monetária dos EUA está marcado para os dias 16 e 17 de setembro. As projeções mais recentes, com agentes do setor financeiro, apontam para uma probabilidade superior a 80% de que um corte de 25 pontos base seja adotado. Se esse cenário se confirmar e, a depender do tom do comunicado, somado à análise de cenários de risco potencial à frente, não será surpresa se novas rodadas de redução na taxa de juros forem praticadas nas últimas duas reuniões do FED em outubro e dezembro.


Ilton Caldeira é jornalista de Economia e Política e especialista em Relações Internacionais pela FGV-SP. Nos Estados Unidos é Head de Comunicação da Dell’Ome Law Firm e sócio da consultoria Smart Planning Advisers.

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